Um ciclista de culto relegado para segundo plano, vitórias épicas pouco faladas e equipas que fecham deixando o pelotão mais pobre.
Imaginem ser Matej Mohoric na era de Primoz Roglic e de Tadej Pogacar. É como ser Steve Kerr durante o período de ouro dos Chicago Bulls de Michael Jordan. Atores secundários com tanto nível que só são abafados por super estrelas.
Como no desporto raramente há prémios para os atores secundários, quis chamar a este texto alguns corredores que tiveram um excelente 2023, mas ao coincidirem com corredores que estão a marcar a história do ciclismo não receberam a devida atenção.
Também considero preocupante a perda de três ProTeams: Bolton Equities, Human Powered Health e Leopard fazem parte dos três momentos subestimados no ciclismo em 2023.
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O terceiro esloveno da hierarquia
Tour de France. Véspera da última etapa montanhosa antes da chegada a Paris. A 19ª etapa era propícia para uma fuga.
Um dia antes o dinamarquês Kasper Asgreen tinha-se aventurado com êxito numa escapada bem-sucedida até Bourg-en-Bresse. Asgreen salvou o Tour da Quick-Step e pensou que podia subir a parada.
A ele juntaram-se Matej Mohoric e Ben O’Connor. Uma fuga à Tour de France com três vencedores de etapas na prova francesa e a quinta média mais rápida da história.
Tudo ficou decidido na meta com um sprint milimétrico em Poligny. Foram 400 m no fio da navalha: Ben O’Connor ainda tentou surpreender de longe, nos últimos 200 m Asgreen fechou o espaço e lançou o sprint com Mohoric a ganhar no photo finish.
Foram 27 segundos de puro controlo de Mohoric sobre Asgreen. O terceiro esloveno da hierarquia somou seis vitórias em 2023 – só em 2018 ganhou mais logo no ano de estreia na Bahrain – e vai acrescentando valor a uma carreira que inclui vitórias nas três grandes Voltas, um Monumento, títulos mundiais de gravel e de estrada (em juniores e em sub-23).
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Ben Healy fez o maior solo do ano numa grande Volta
Foi um dos corredores mais combativos do Giro de Itália, brilhou nas Ardenas, mas não figurou nos melhores do ano para a Vélo Magazine. Ben Healy, irlandês da EF Education, é a prova de que os animadores de etapas são pouco reconhecidos no ciclismo atual.
A 8ª etapa do Giro teve 12 sonhadores em fuga, mas um ataque a 50km da meta deu o triunfo à EF. Ben Healy fez o maior solo do ano numa grande Volta e deu quase dois minutos ao colega de escapada, Derek Gee.
Foi a estreia a vencer numa “grande” do rapaz de 22 anos criado na parte Ocidental das Midlands, mas que desde 2016 passou a representar a Irlanda. Nunca um irlandês tinha liderado a classificação dos trepadores.
Ben Healy é breakaway artist – um artista da fuga – pelo que na manhã da etapa optou pelo fato de contrarrelógio em vez do tradicional maillot e calção. Motivo? A alta probabilidade de um triunfo para a fuga.
Noutra dimensão, mas com a mesma apetência para missões improváveis, tivemos Alexis Guerin, protagonista do maior solo vitorioso da temporada fora de uma grande Volta. Ao serviço da Bingoal WB o francês saiu airoso de um ataque a 95km do final da 4ª etapa da Semana Internacional Coppi e Bartali.
Em 61 dias de competição Alexis Guerin só registou um abandono; fechou a época forte sendo 8º na Volta à Turquia. Em 2024 vai correr no projeto Continental belga Philippe Wagner/Bazin. Nem a boa imagem deixada pela Bingoal WB impediu o caçador Alexis Guerin de correr na terceira divisão.
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Bolton, Human Powered e Leopard fecham portas
Em 2024 haverá 17 ProTeams, menos uma estrutura do que em 2023 e menos oito face a 2019. Não subestimemos estas perdas: equipas ganhadoras, formadoras de talento e com bons calendários não encontraram viabilidade financeira e isto é preocupante.
A Bolton Equities – primeira equipa profissional neozelandesa – durou um ano como ProTeam. A Human Powered Health fez 17 temporadas, as últimas seis na segunda divisão. A Novo Nordisk passa a ser a única ProTeam dos Estados Unidos, o que vai ao encontro do desinteresse americano pelo ciclismo de estrada desde que rebentou o escândalo Lance Armstrong.
A Human Powered Health (antiga Optum e Rally) segue o caminho de outras equipas estadunidenses – Holowesko e Unitedhealthcare, por exemplo – que também não tiveram pedalada para o segundo escalão. Deste programa saíram craques como Sepp Kuss e Matteo Jorgenson.
A Bolton Equities foi a melhor Continental em 2022 e revelou o sprinter George Jackson (cinco vitórias), um pistard de sucesso como os colegas Aaron Gate ou Mark Stewart. Se Gate segue Jackson para a Burgos-BH, Stewart vai para a Corratec.
O caso da luxemburguesa Leopard é diferente. Nasceu das cinzas da Leopard Trek, tentou passar a ProTeam e não encontrou apoios. Ainda se fundiu com a Riwal, mas do mercado dinamarquês não choveram milhões – nem ter o bicampeão do Tour de France motivou as marcas.
A Leopard foi a 4ª equipa do circuito UCI Europa e top 20 do continente. Ouviremos falar do sprinter Tim Torn Teutenberg, que assinou pela Lidl-Trek e foi campeão europeu da eliminação batendo Rui Oliveira. Pela Leopard passaram, por exemplo, Andreas Kron (Lotto Dstny) e Arvid de Kleijn (Tudor).
Bolton, Human Powered e Leopard fecham portas. Um dos momentos negativos de 2023.
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