Não é novidade para ninguém que a UCI queria organizar um campeonato do mundo de Gravel Bikes, ou organizar eventos UCI de Gravel Bikes, a única coisa que arrefeceu os desejos da UCI foi a pandemia, caso contrário já seria uma realidade por esta altura.
O que é conhecido sobre o assunto
Na passada semana a UCI anunciou a criação de uma Gravel Series e Campeonato do Mundo de Gravel Bikes. Esta decisão acrescenta assim uma décima disciplina aos eventos do organismo que regula o ciclismo mundial, juntando o Gravel à Estrada, Bicicleta de Montanha, Pista, Ciclocrosse, BMX, BMX freestyle, Trial, Ciclismo indoor e E-Bikes.
De acordo com a imprensa internacional (e com o Press-release original), a UCI fez parceria com o organizador de eventos belga “Golazo” para criar uma “UCI Gravel World Series”, eventos estes que servirão de qualificação para o novo “UCI Gravel World Championships”.
Ainda não foram revelados detalhes sobre as regras que regem os eventos de Gravel, ou quais os eventos que farão parte da Gravel Series.
Sabe-se por exemplo que na “Eroica” (evento na Toscana, Itália) se ofereceram para receber o primeiro Campeonato do Mundo, mas sabendo a UCI que o Gravel nasceu e tem mais expressão nos Estados Unidos da América (EUA), acredita-se que poderá ser lá.
Nos EUA já existe um evento de Gravel com o nome “Gravel Worlds” (em Lincoln, Nebraska), mas esse nome foi colocado precisamente como “brincadeira” ou sátira àquilo que seria um Campeonato do Mundo, conceito no qual esse evento não se enquadra porque pode participar qualquer pessoa.

As palavras de David Lappartient, presidente da UCI, após a reunião sobre esta e outras novidades para 2022:
“O ciclismo continua a inovar, desta vez no “off-road” com a criação de um novo ranking muito interessante para o cross-country short-track, o reconhecimento do Gravel – uma disciplina adicional em rápida expansão – o lançamento de um novo formato de corrida por equipas (team relay) no ciclocrosse e a exploração de novos caminhos para o desenvolvimento do “snow bike”. “
A UCI e o Gravel – as opiniões dividem-se
Para os que eventualmente ficaram muito entusiasmados com a ideia, ou para os que também ficaram menos entusiasmados com a ideia, digo-vos que por todo o mundo e comunidade ligada ao Gravel (seja de atletas ou organizadores de provas), as opiniões também não são unânimes.
Há os que não vêem isto com bons olhos, porque o Gravel está ligado à “clandestinidade”, ao desfrutar da bicicleta, dos locais, da natureza e das culturas por onde se passa, e os eventos de Gravel existentes são isso mesmo, dão para o ciclista que quer andar rápido e colocar-se à prova, e para o que quer desfrutar da pedalada calmamente.
Profissionalizar os eventos e colocar-lhes regras é algo que muitos atletas ou organizadores de referência do Gravel não vêem com bons olhos.

Ian Boswell, ex-ciclista profissional World tour, agora no Gravel e vencedor do Unbound Gravel, diz que não tem a certeza se o envolvimento da UCI é uma coisa positiva para o Gravel, nem se ele próprio correrá no Campeonato do Mundo de Gravel Bikes da UCI.
“Uma coisa que adorei no Gravel é que cada corrida é muito diferente, permitiu que novas pessoas entrassem no desporto, deu-nos boas histórias de pessoas de um amplo espectro de preparação física,”
disse Boswell.
Depois há os cautelosos, que querem esperar para ver o tipo de regras que a UCI vai colocar nos eventos, e se para ir a um Campeonato do Mundo, terá que se arrecadar pontos de qualificação na Gravel Series.
Também acerca das regras, muitos querem esperar para ver se as longas distâncias e pedalar em autonomia vai ser tido em conta (algo que faz parte do conceito actual das provas de Gravel mais mediáticas).

Amanda Nauman, duas vezes vencedora do Dirty Kanza (agora Unbound Gravel), e organizadora de eventos diz:
“Depende do foco que eles (UCI) irão colocar na participação em massa, nas regras, na estrutura, e se eles se mantêm firmes na perspectiva de usar o Gravel para inspirar as pessoas a utilizar bicicletas como parte de suas vidas cotidianas”,
E por último há optimistas, que acreditam que uma Gravel Series e Campeonato do Mundo, vai servir para fazer expandir ainda mais o conceito pelo mundo, dinamizando mais a industria e trazendo mais pessoas para este conceito.

Lauren De Crescenzo, a ciclista vencedora do Unbound Gravel (o maior e mais mediático evento de Gravel) diz:
“Sinto que o envolvimento da UCI pode colocar o Gravel num patamar acima; os fãs poderiam seguir os ciclistas na Gravel Series, haveria mais audiência global e consequentemente mais visibilidade para os jovens que se estão a iniciar. Estou animada com o desenvolvimento deste desporto e acho que isto pode criar novas oportunidades.”
A minha opinião
Não que eu seja alguém de referência, mas acompanho e adoro o conceito Gravel desde que o descobri em 2014 quando vi Greg LeMond falar disto num programa do Eurosport, tive a oportunidade de escrever sobre o conceito AQUI, e faço parte dos cautelosos.

O facto da UCI se meter no assunto, trazendo uma Gravel Series e Campeonato do Mundo vai causar impacto, acredito que pode desbloquear algumas mentes e desmistificar o conceito para os menos familiarizados com ele.
Como tal, acredito também que é algo que pode alavancar e dinamizar ainda mais a industria neste segmento de bicicletas, principalmente em Portugal, onde embora já se comesse a ver, tem pouca expressão ainda.
No entanto, também sou cauteloso no que diz respeito ao conceito do Gravel, que está ligado à “clandestinidade”, ao viajar, ao desfrutar da natureza sem ter que bater um cronómetro, no qual se pode montar uma bicicleta que faça o que queremos fazer com ela, sem regras de medidas de pneus, sem regras de poder ter ou não ter amortecedor, guiador mais largo ou menos largo, mais direito ou menos direito, com extensores ou sem extensores.

Acrescento mais, cauteloso porque no Gravel pode andar com o rabo em cima do quadro da bicicleta quem quiser, seja num evento com profissionais ou não, e cada um pode utilizar as meias da medida que se quiser.
Estou a ser um pouco irónico, porque na verdade nos Granfondos e Maratonas BTT ninguém tem que cumprir certas regras UCI, mas as marcas quando constroem bicicletas têm! Até vem lá um selo “UCI aproved”.
Então certo tipo de regras não combina com o conceito que fez crescer o Gravel, e se numa primeira fase não o vai afectar, no futuro não saberemos, portanto pode ser “um pau de dois bicos”. Desenvolve a industria mas veremos o que será dos eventos de Gravel e do seu conceito no futuro.
Para Portugal (país onde a coisa começa “a mexer”, mas ainda não há muito utilizador Gravel) creio que vai ser bom (se a Gravel Series resultar), pois o mediatismo que a UCI vai proporcionar a esta vertente vai trazer mais utilizadores a tipo de bicicleta, vai motivar organizadores a fazer eventos e daqui por 5 anos as vendas de Gravel irão ser maiores que as de BTT. (Esta ultima parte é brincadeira, ou não!)
Por: Luís Beltrão
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