Cada vez estou mais convencido de que não se passa nada de errado com Wout Van Aert. Só tem um Monumento? Não ganhou o Mundial? E depois?
Admito que passei o inverno a pensar que ele estava na equipa errada. A Visma não tem ligação ao ciclocrosse, há muitos galos para as clássicas e Van Aert não corre com liberdade nas grandes Voltas.
Provavelmente estava sob influência das palavras de Johan Museeuw, que foi muito crítico com o corredor de Herentaals.
“Van Der Poel é o favorito porque ganhou Sanremo, Roubaix e Mundial. Van Aert ganhou Sanremo, mas parou e é hora de que se concentre nas clássicas. Falta-lhe instinto assassino para ganhar, não se oferece uma Gent-Wevelgem. Van Aert está feliz de trabalhar para outros, Van Der Poel não trabalha para outros, por vezes lança Philipsen, mas é só isso. Não trabalha durante três semanas.”
Johan Museeuw
Na Alpecin-Deceuninck não há dois líderes
Foi duro o Leão da Flandres, mas não disse mentiras. Van der Poel distanciou-se do eterno rival em 2023 incrível após ganhar Mundial de ciclocrosse, Milão-Sanremo, Paris-Roubaix e Mundial de estrada. Até deu para esconder o horrível Tour de France que fez.
Na Alpecin-Deceuninck não há dois líderes. Até Philipsen sabe que Van der Poel é a obra-prima que os irmãos Roodhoft protegem como o Louvre protege a Mona Lisa.
A Omloop Het Nieuwsblad deu-nos Wout Van Aert em estado puro. Perante a oportunidade de discutir a vitória, analisou e deixou que fosse Jan Tratnik a ganhar.
Acabou 3º e a Visma ainda meteu Laporte em 5º. Se o final fosse num teatro a plateia tinha-se levantado para aplaudir!
“Com tipos como o Arnaud De Lie não estava 100 por cento seguro de poder ganhar o sprint. O ataque do Jan Tratnik foi a melhor tática. É uma vitória muito bonita. Estou muito contente por como ganhamos. Podia ter sido eu a ganhar, mas avisamos antes que tinhamos corredores diferentes para ganhar e mostramos isso mesmo.”
Wout Van Aert
Esta frase é ou não é o sonho de qualquer diretor desportivo? Imagino o Richard Plugge com uma lágrima no canto do olho enquanto assiste ao domínio coletivo da Visma que já na época passada colecionou triunfos no pavê.
- Wout Van Aert ganhou a E3 Saxo Classic
- Tiesj Benoot ganhou a Kuurne-Bruxelas-Kuurne
- Dylan van Baarle ganhou a Omloop Het Nieuwsblad
Depois falharam na hora H, mas compensaram nas grandes Voltas levando as três!
Maestro da estrutura que reescreve a história
De certa forma a Omloop Het Nieuwsblad foi a continuação de uma tendência que já vimos na Gent-Wevelgem. Lembram-se de quando o generoso Wout fez a seleção, despachou a concorrência e rebocou o colega Christophe Laporte até à meta apenas para lhe dar a vitória?
Este ciclista é brilhante, mas falta-lhe uma característica inerente às lendas: o narcisismo. Ou pensam que se chega ao topo do que quer que seja sem danos colaterais?
Total empatia da minha parte. Não nasci para impor a minha presença e pelo que vejo ele também não… pelo menos não ao nível de Van der Poel, Boonen ou Museeuw.
Se a questão é o legado, que melhor elogio pode receber um homem que dá tudo pela equipa do que ser recordado como maestro da estrutura que reescreve a história?
Podia ser pior. Imaginem que tinha acontecido a Wout Van Aert o que aconteceu a Frederik Frison, que nem correu a Omloop Het Nieuwsblad depois de ser mordido por um cão nos toma… nas partes íntimas.
Levem-nos tudo, menos as joias da coroa.